quinta-feira, 26 de junho de 2014

Sibipiruna - 06/07/2014 - Homenagem a Aniceto do Império


Aniceto do Império
"Partido-Alto é um caso sério" 




“O meu pai é rei das matas
Minha mãe senhora do rio
Uso tanga a noite
Sem camisa não sinto frio”


Aniceto Menezes e Silva Junior foi um dos maiores “partideiros” que a terra já viu. Trabalhou durante trinta anos como  arrumador no cais do Porto do Rio de Janeiro, cidade onde nasceu em 1912. Liderou o sindicato dos arrumadores em diversas e exitosas greves, inclusive durante a greve histórica de 1946.

O Morro da Serrinha foi o lugar onde Aniceto fez sua morada musical, apesar de não residir fisicamente por lá. Ali no morro cantou o seu samba e firmou ponto no jongo de Tia Maria, ao lado de Mestre Fuleiro, Mano Elói, Sebastião Molequinho, Mano Décio da Viola, Mestre Silas de Oliveira e outros bambas mais, companheiros de fundação da tradicional Escola de Samba Império Serrano, que surgiu sob a égide da democracia em 1947.

Mestre Aniceto fez-se doutor na arte do Samba de Partido-Alto, modalidade de Samba em que um solista realiza versos de improviso entremeado por refrões cantados em coro. Para ele, a arte do Partido-Alto não se aprende, mas é um dom. Nos diversos modos diferentes de cantar e compor partido-alto, Aniceto foi dos melhores e mais versáteis. Diz a lenda que não havia, no Rio de Janeiro, maiores “partideiros” do que Aniceto do Império e Padeirinho da Mangueira. Em um encontro entre os dois, quem viu viu, quem ouviu ouviu e guardou na memória. Quem ficou, conta a história e há quem diga que um foi o melhor, há quem diga que foi o outro.

Ao longo da sua respeitável trajetória no samba, Aniceto destacou-se pela excelente oratória. O mestre valia-se sempre de palavras rebuscadas, tanto em suas composições de samba como em suas falas, discursos e entrevistas. Esta qualidade o levou ao cargo de orador da Escola de Samba Império Serrano, função que desempenhou com notável maestria e galhardia.

Na arte do Partido-Alto, Aniceto foi reverenciado por grandes sambistas como Mestre Candeia, João Nogueira, Martinho da Vila, Dona Ivone Lara e Roberto Ribeiro, nomes com os quais gravou e versou. Sua discografia traz dois discos solos voltados exclusivamente para a arte do Partido-Alto. Em 1977 lançou, acompanhado do saudoso Campolino, outro partideiro de primeira, o disco “O Partido-Alto de Aniceto e Campolino”. Em 1984 lançou o seu mais conhecido disco, “Partido Alto Nota 10”, que é uma verdadeira aula de partido-alto e conta com participações de Roberto Ribeiro, Dona Ivone Lara, João Nogueira, Clementina de Jesus, Martinho da Vila e Zezé Motta. Entre estes dois discos, Aniceto participou das coletâneas “Quem Samba Fica” e “Os Bambas do Partido-Alto” sempre gravando suas composições. Aniceto também participou do disco “Luz da Inspiração” de sua amigo Candeia, quando os dois cataram o partido “Maria Madalena da Portela”, composição de Aniceto. 

No próximo dia 06 de Julho, domingo, às 15h, é a Sibipiruna quem presta sua singela homenagem ao mestre Aniceto do Império. Com respeito, pedimos licença aos mais velhos, aos ancestrais, às Entidades e aos Orixás. E vamos de Partido-Alto. Axé!  
 
   


PS. Eduardo Coutinho entrevistou Aniceto do Império para o excelente filme “O Fio da Memória” em 1988, quando o mestre estava internado no hospital, cego e com diabetes. Esta é, talvez, uma das mais formidáveis entrevistas já realizadas em um documentário brasileiro. Com sua oratória apurada, há na entrevista um momento em que Aniceto praticamente inverte a situação e passa a entrevistar Coutinho, deixando o hábil entrevistador em apuros, sob os olhares apaixonados e as gargalhadas da enfermeira do hospital. As respostas do sambistas são auspiciosas e inteligentes. Em determinada altura da entrevista, Coutinho pergunta ao velho Aniceto:

Coutinho: O senhor esta com diabetes?
Aniceto: Graças a Deus eu sou diabético.
Coutinho: Porque Graças a Deus?
Aniceto: Porque Deus quer assim e eu devo aceitar tudo aquilo que ele manda. Ele sabe o que faz e eu não sei o que quero.

Confira a entrevista!

Basta clicar no link do Youtube abaixo e seguir para o minuto 1:01:18 do filme, quando começa a segunda parte, justamente sobre Aniceto.




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