sexta-feira, 4 de março de 2016

"Todo mundo te conhece ao longe pelo som dos teus tamborins e o rufar do teu tambor... Chegou, a Mangueira chegou!"

     Por Carla Vizeu

     Quando eu era criança, eu queria ser o Jamelão. Passava as noites de desfile (tentando ficar) acordada só pra poder ouvir sua voz poderosa chamando a verde e rosa pra avenida: "Madeira de dar em doido é Jequitibá, deixa a Mangueira passar!"
     É este tipo de paixão que a Estação Primeira desperta. É daqueles amores contundentes, eternos, amor de Mangueira que "bate e fica"... Quem gosta, ama. E quem não gosta, respeita.
     A dois anos de completar seu centenário, nasceu no morro que lhe batizou, fundada por Angenor de Oliveira (Cartola), Saturnino Gonçalves (Seu Saturnino), Abelardo da Bolinha, Carlos Moreira de Castro (Carlos Cachaça), José Gomes da Costa (Zé Espinguela), Euclides Roberto dos Santos (Seu Euclides), Marcelino José Claudino (Seu Maçu) e Pedro Paquetá, que resolveram unir os diversos blocos existentes no morro. A Central do Brasil há muito já tinha oficializado o apelido do morro ao denominar a estação ali instalada de Estação de Mangueira. Como era a primeira parada na direção do subúrbio onde havia samba, a escola ganhou o nome de Estação Primeira. As cores verde e rosa foram sugeridas por Cartola. 
     Mangueira já era berço do samba e musa desde antes da fundação da escola. O primeiro compositor a dedicar uma música a Mangueira foi Manoel, Dias, em 1925. Pouco depois, em 1929, o samba "Chega de demanda", de Cartola, feito para proclamar a união dos blocos do morro, saiu do morro e conquistou a cidade.
     Muitos foram tocados pelo encanto da Mangueira, o que rendeu muitos e lindos sambas. Seu cenário, suas cabrochas, a vida do morro foram exaltados pelos mais diversos compositores: moradores do morro e integrantes da escola, como Cartola, Nelson Cavaquinho, Zé da Zilda, Geraldo Pereira, Herivelto Martins, tantos!... e admiradores da mesma, como Assis Valente, Noel Rosa, o portelense Paulinho da Viola, Tom Jobim, Chico Buarque... A lista é imensa.
     Em "Mundo de zinco" (1952), parceria de Wilson Batista com o caricaturista Antônio Nássara,  se revela o sentimento de pertencimento ao morro e de reconhecimento de sua cultura musical, mostrando a favela a partir de suas características físicas constituída como espaço de habitação precária, improvisada, mas com fortes laços emocionais: "Aquele mundo de zinco que é Mangueira/ Desperta com o apito do trem/ Uma cabrocha, uma esteira/ Um barracão de madeira/ Qualquer malandro em Mangueira tem/ Mangueira fica pertinho do céu/ Mangueira vai assistir o meu fim/ O samba foi minha glória/ E sei que muita cabrocha vai chorar por mim."
     Das mais conhecidas e literais exaltações, se destaca "Exaltação a Mangueira", de Aloísio Augusto da Costa e Enéas Brittes da Silva (1955), que tem uma história curiosa.  Aloíso lembra: "A princípio, a gente fez os versos Todo mundo te conhece até no interior/ Não é bafo de boca/ Nem mania, não senhor. Mas o Presidente da Mangueira, Hermes Rodrigues, reclamou: 'Desse jeito não tá legal.' Então ficou assim: Todo mundo te conhece ao longe/ Pelo som de teus tamborins/ E o rufar do teu tambor..."
     Nelson Cavaquinho e Guilherme de Britto escreveram Folhas secas para ser cantado por Beth Carvalho, mas o samba foi lançado primeiro por Elis Regina. Duas gravações feitas no mesmo ano, 1973, ambas emblemáticas e bem diferentes entre si.
     Foram muitos sambas feitos em louvor a esta dama quase centenária, ao que ela representa para os apaixonados pelo samba e para a cultura brasileira. Dava pra escrever muitos livros! De acordo com o idealizador do livro "Sambas para a Mangueira", uma edição de partituras, foram encontrados mais de 260 sambas em sua homenagem.
     Neste ano em que a Estação Primeira de Mangueira chegou ao primeiro lugar após um desfile e apuração emocionantes, a Sibipiruna vai cantar um pouco deste encanto entoado por tantos poetas. Convidamos todos a vir cantar conosco neste próximo domingo, 06/03, à sombra de nossas sibipirunas mangueirenses. Bar Esquina 108, 16h.

Fontes: 
"Sambas para Mangueira". Edição especial Samba em Revista. Centro Cultural Cartola, organização Nilcemar Nogueira. Rio de Janeiro: Irmãos Vitale, 2015.
Site oficial da escola: http://www.mangueira.com.br/


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