Nascia, em 25 de julho de 1924, aquele que posteriormente ficaria conhecido como um dos grandes compositores da história do samba: Nelson Mattos, popularmente conhecido como Nelson Sargento. Apelido conquistado pelos serviços prestados às forças armadas, Nelson Sargento é a história viva do samba, é o próprio samba em pessoa, quase uma entidade. Aos noventa anos de idade nosso querido Nelson pode ser visto como testemunha ocular das transformações que o samba e a sociedade passaram desde os “tempos idos”, até os “dias atuais”.
Nascido na Tijuca, Nelson viveu boa parte de sua infância no Morro do Salgueiro com sua mãe Rosa Maria, empregada doméstica e lavadeira. No morro Nelosn aproximou-se do samba, chegando a tocar tamborim em desfiles da escola “Azul e Branco”, uma das três escolas que posteriormente formariam o Acadêmicos do Salgueiro.
Por questões de ordem financeira, Nelson, ainda jovem, foi morar no Morro da Mangueira. Lá ele conheceu um Alfredo Português, antigo compositor do Estação Primeira de Mangueia, que o aproximou da escola. “Apadrinhado” por Carlos Cachaça, Nelson Sargento se aproximou de Cartola e Nelson Cavaquinho, com os quais aprendeu a tocar violão e aperfeiçoar suas melodias. Aos poucos foi sendo reconhecido pela escola, sendo coroado com a escolha de seus samba-enredo “Primavera” (um dos mais bonitos de todos os tempos) para defender as cores da Mangueira no carnaval de 1955.
Nos anos 60 passa a frequentar o “badalado” bar Zicartola, ganhando maior notoriedade do meio artístico-profissional e de grupos sociais com maior poder aquisitivo, consumidores da arte e cultura. Nesta época foi convidado a participar do espetáculo “Rosa de Ouro” e passou a integrar o grupo “A Voz do Morro” junto com outros bambas (tais como Zé Kéti, Paulinho da Viola, Elton Medeiros, Anescarzinho do Salgueiro, Jair do Cavaquinho, Zé Cruz e Oscar Bigode), gravando dois discos.
Assim como outros bambas da época, Nelson foi condenado ao ostracismo nas décadas seguintes, muito por conta de novas influências musicais e artísticas que despontavam e redirecionavam o mercado fonográfico do momento. A crescente e caótica urbanização e a introdução de novos padrões de entretenimento e sociabilidade foi remodelando os padrões culturais, impondo transformações inclusive na forma de se fazer samba. Como consequência a Velha Guada do samba já não era tão interessante para os negócios culturais.
Em 1979 Beth Carvalho gravou uma música de Nelson Sargento que se tornaria, em suas palavras, o “hino do samba”: Agoniza mas não Morre. Este samba não deixa de ser uma resposta as transformações apontadas acima, mas além disso, indica a resistência do próprio samba, mesmo com modificações em sua estrutura, a tais transformações. Porque nem sempre as mudanças de ordem política e econômica são capazes de solapar uma cultura genuína e espontânea, base para o autorreconhecimento e identidade de certo grupo ou classe social.
Apesar disso, Nelson Sargento nunca foi saudosista ao ponto de negar as transformações que as novas gerações impuseram ao samba. Ele, certa vez, disse que, quando jovem, também queria fazer as coisas de forma diferente, de seu jeito. A diferença, segundo ele, era que existia, naquela época, certo respeito e uma busca de aprendizado com os mais velhos, aspecto que foi se perdendo com o passar das gerações.
Nelson não foi apenas um grande sambista, mas também um grande artista plástico e um grande filósofo do samba e da vida. Em seus sambas as questões existenciais se confundem com os problemas do cotidiano, não existindo soluções simplistas ou maniqueistas para os dilemas da vida. Ouvir e tocar Nelson Sargento é aprender, aprender sobre nós mesmos, sobre os outros e sobre o mundo. O samba, este “negro forte e destemido”, lhe agradece.
Por essas e outras o Projeto de Samba Sibipiruna tem, humildemente, a honra de homenagear este grande mestre do samba cantando algumas de suas principais canções neste domingo, dia 7/12/2014, a partir das 16 horas, no Bar Esquina 108, próximo à moradia estudantil da Unicamp.